sábado, 13 de setembro de 2008
Eugénio de Andrade
SOUVENIR AFRICAIN
O gato aproximou-se, escutando também ele o silêncio hirto
das palmeiras, que são no horizonte a primeira coisa verdadeira
que nos assoma aos olhos, mesmo antes de haver o que
possa chamar-se claridade. O casario afogado no escuro respira
anónimo e reles, a face encardida, a fenda estreita da boca por onde dificilmente passará a luz, que de súbito rompeu no terraço e não tardará a escaldar. Depois o sol acalma, e lá para
o fim da tarde uma sombra mole escorre do muro para o cimento aquecido. É então que o gato se transforma em cadela, arrastando-se até aos nossos pés, deitando-se de costas, o ventre carnudo ávido do prazer profundo que lhe oferece por fim a mão.
5.6.85
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